14º MotelX – Epílogo
2020 foi, sem dúvida alguma, um ano atípico em todos os sentidos. O MotelX que assombra Lisboa desde 2007, voltou a povoar a cidade de terror, mistério e fantasia. Os milhares de aficionados e cinéfilos, que voltaram a acorrer ao Cinema S. Jorge, apesar da lotação reduzida, fizeram desta edição mais um sucesso.
Com um prazo alargado, a edição deste ano começou, como sempre, com os warm-up events, que tiveram início a dia 3 de Setembro com A Mulher-Sem-Cabeça, no Convento de São Pedro de Alcântara, num evento que juntou Gonçalo M. Tavares, MC Papillon e António Jorge Gonçalves, onde a literatura, música e desenho se uniram, com a direção artística de Paulo Duarte Ribeiro. Dia 4, a Brotéria foi o espaço anfitrião de Um Jantar Muito Original, encenado por Matilde Sousa Carvalho e Rita Poças, com a supervisão artística de Albano Jerónimo. A partir de um conto de Alexander Search, o lado «mais negro» de Fernando Pessoa veio ao de cima. A sessão de cinema ao ar livre, no dia 5, no Largo Trindade Coelho, exibiu The Host – A Criatura (2006) do sul-coreano Bong Joon-ho.
Pedro Costa foi um dos grandes nomes do MotelX 2020, e para além de termos sido presenteados com a exibição de dois dos seus filmes – Ne Change Rien (2009) e Cavalo Dinheiro (2014) –, o MOTELX Lab, apresentou ainda uma sessão no dia 12, Filmar as Trevas: Conversa com Pedro Costa. Ainda dentro do MOTELX Lab, na Masterclass: «A aventura da Bro Cinema em Color Out of Space», no dia 13, a Bro Cinema falou da sua aventura em Nova Iorque, num filme protagonizado por Nicolas Cage.
Dia 7 foi oficializada a abertura do MotelX 2020, que se estendeu por mais 7 dias, repletos de pura emoção, horror e misticismo. Dia 7, a Sala Manuel de Oliveira recebeu a Sessão de Abertura acompanhada por «Malasaña 32», de Abert Pintó. Na mesma noite foi possível ver A Beast in Love, de Koji Shiraishi, em estreia mundial. Nessa mesma noite, foi exibido o primeiro filme – Hunted, de Vicent Paronnaud – dos 10 concorrentes à Melhor Longa de Terror Europeia / Méliès d’argent.
As crianças não deixaram de estar representadas através do «Lobo Mau», que une o terror ao universo infantil e cria, através de jogos e sessões fílmicas, um núcleo de partilha e convívio. Este ano, os mais pequenos puderam ver O Peculiar Crime do Estranho Sr. Jacinto (2019), de Bruno Caetano, e A Família Addams (2019) de Greg Tiernan e Conrad Vernon.
Já tínhamos sublinhado, mas a presença feminina nesta edição é estonteante. Cinco dos dez filmes presentes na competição Melhor Longa de Terror Europeia / Méliès d’argent foram realizados por mulheres, tendo saído vencedor o filme, Pelican Blood de Katrin Gebbe. Houve também uma interessante variedade geográfica, desde First Love, do Japão, The Trouble With Being Born, vindo da Áustria, Darkness da Itália, e Saint Maud e Amulet de Inglaterra, todos filmes criticados aqui no Artes & contextos.
A competição anual para a melhor curta metragem é um dos pontos altos do festival, onde o talento nacional vem ao de cima, e se descobrem novos nomes todos os anos. Este ano, o grande vencedor foi Fábio Rebelo, com Mata.
Na entrevista de David Bernardino, da Comunidade Cultura e Arte, aos diretores do MOTELX, Pedro Souto e João Monteiro, tal como havíamos destacado na reportagem da Press Première, foi demonstrada a clara preocupação com a realização do festival, e até que ponto seria passível de tal acontecer. Apesar das dificuldades em relação às distribuidoras, «o teletrabalho permitiu-nos ter mais facilidade em ver novos filmes em casa o que ajudou em muito à seleção do programa, da edição deste ano.»
A organização primou pelas medidas de segurança e prevenção apertadas, com o uso obrigatório de máscara durante todas as sessões, e nos espaços comuns do cinema, gel desinfetante, e as saídas das salas eram realizadas para o exterior, e nunca para o interior do cinema. Entre cada espectador existiu uma cadeira de distância, de modo a garantir o necessário distanciamento social. Sem deixar de relevar o papel brilhantemente desempenhado pelos frentes de sala que guiavam os espectadores aos lugares, e geriam as saídas.
Outra das questões que o festival primou em sublinhar foi o Racismo. Fruto da corrente emergente de casos de violência contra a comunidade negra, vital nas redes sociais, muitos casos que haviam sido abafados, estão agora a ressurgir. Assim, a secção «Pesadelo Americano: O Racismo no Cinema de Terror» foi sem dúvida um acréscimo importante ao festival.
De realçar também o fantástico trabalho da Playground, que mais uma vez elaborou o genérico para os ecrãns. Desta vez o spot passa-nos a mensagem que “o Mal anda de mãos dadas com o Belo. Os dois fazem par numa dança elegante que nos fascina e atrai”, numa dança protagonizada pela bailarina Almudena Maldonado, com direcção criativa, realização e fotografia de Rui Vieira.
Apesar do que todos estamos a passar, e as privações a que nos vemos obrigados, é importante olhar para estes eventos como exemplos de uma realização conscienciosa e preventiva, que permitem que possamos usufruir de uma vida social e cultural, de forma segura e responsável.
Foram oito dias repletos de puro terror, mistérios, fantasia e algumas boas gargalhadas, mas acima de tudo, sorrisos que se expressavam pelo olhar daqueles que sentiram que o horror voltou a assombrar Lisboa.
Até para o ano, MotelX!
Os filmes que selecionámos e criticámos nesta edição do festival foram:
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Licenciada em História da Arte, apaixonada por arte e fotografia, com o lema: a vida só começa depois de um bom café, e uma pintura de Velázquez.