PELICAN BLOOD, de Katrin Gebbe
A 14ª edição do MotelX fez história em várias perspetivas, a começar por se ter realizado em plena pandemia. Mas, queremos destacar coisas boas e felizes, e uma delas é a notícia de que Katrin Gebbe, realizadora de Pelican Blood (Pelikan Blut), foi a primeira mulher vencedora da Longa Internacional, no Festival. Numa edição em que o número de realizadoras foi substancial, a representatividade feminina na realização está em ascensão, dentro e fora do cinema de género.
Com a talentosíssima Nina Hoss, uma das atrizes de vulto no panorama alemão contemporâneo no papel principal, Pelican Blood é um filme surpreendente e cativante, cuja história retrata um sério drama familiar, de uma forma bastante emocionante. É, não obstante, um filme de terror, com uma considerável camada de espiritismo e do demo nisto tudo.
Wiebke (Nina Hoss), é treinadora de cavalos policias e vive numa quinta com a sua filha adotiva Nikolina (Adelia-Constance Ocleppo). O ambiente familiar é estável e repleto de amor, o que faz Nina procurar adotar outra criança, neste caso uma adorável menina de cinco anos, a pequena Raya (Katerina Lipovska).
A partir daqui a narrativa ganha outra tonalidade e dimensão quando alguns comportamentos de Raya se afiguram extremamente agressivos, complexos, e até, assustadores. A sua voz sofre mutações, tal como o seu olhar e as suas expressões corporais, mostrando-nos que algo vive dentro dela, e que dela se apodera.
Preocupada com o seu bem-estar e da sua filha mais velha, Nina, apesar de em constante negação e recusa em abrir mão de Raya, sob pena de a ver institucionalizada de novo, leva-a a um psiquiatra infantil. Este, faz uma análise profunda da criança: sofre um claro transtorno emocional, fruto de nunca ter tido qualquer empatia, nem relacionamento humano mais direto. Isto traduzia-se na sua ausência de sentimentos e emoções. Tudo o que expressava eram meros mimetismos do que via: sorrir, chorar, rir, etc…
Ainda perante este quadro clínico, Nina recusa-se a desistir da filha, recorrendo aos métodos mais extremos, tal como tomar medicação para provocar leite materno e assim poder amamentar Raya, com o objetivo de estabelecer uma ligação afetiva e maternal com a criança. Começou entretanto a existir um claro afastamento de Nikolina, que procurava refúgio noutras pessoas que rodeavam a família.
Era claro aos olhos de todos que a relação não era saudável para ambas as partes e que estava a destruir Nina a olhos vistos. O nome do filme retrata exatamente o sacrifício de Nina em relação a Raya: a mãe pelicano que abre o ventre para alimentar as crias com as suas próprias tripas.
Nada resultava, levando a mãe extremosa a recorrer a bruxaria e magia negra para retirar o mal que vivia dentro da sua filha.
Embora entenda a opção da realizadora, parece-me que é passada uma mensagem negativa de um distúrbio real, ao confundi-lo com possessão demoníaca, mas afinal é de terror que se trata, não é justo esperar mensagens doces.
É de realçar o magnifico desempenho de Hoss, que demonstrou ser uma magnifica e versátil atriz, tal como da pequena Katerina. O guião está bem estruturado dando um corpo interessante ao filme, que nunca perde o interesse, e mantém um ritmo estável até ao final.
Quanto precisará de sangrar Nina para tentar que Raya sinta?
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Licenciada em História da Arte, apaixonada por arte e fotografia, com o lema: a vida só começa depois de um bom café, e uma pintura de Velázquez.