
AMULET – MotelX0 (0)
11 de Setembro, 2020
AMULET de Romola Garai
O terror no feminino é algo ainda por explorar, terreno ainda muito desconhecido. O Arte & contextos não quis deixar de reconhecer essa presença na 14ª edição do festival, e por isso, decidimos analisar mais um produto cinematográfico, onde 80% do staff, desde a realizadora, produção, música, guarda-roupa, está nas mãos de mulheres.
Amulet é, verdadeira e declaradamente, um filme feminista e que pretende chocar. Assim o faz. A talentosíssima Romola Garai, na sua primeira longa metragem, juntou-se a Sarah Angliss, responsável pela música, e compôs uma das jóias desta edição, que não deixou ninguém indiferente.

Miriam(Angeliki Papoulia), Tomaz (Alec Secareanu) e a mãe (Anah Ruddin) em Amulet (2020) Foto ©IMDB
Tomaz (Alec Secăreanu), um soldado sem-abrigo, vê a oportunidade de ter um teto, através de uma proposta da Freira Claire (Imelda Staunton), que lhe recomenda uma casa decadente e que, em troca de estadia, o obrigaria a fazer pequenos arranjos e reconstruções nessa mesma casa. Lá, habitam Magda (Carla Juri) e a sua mãe (Anah Ruddin), que está batante doente. Somos, de uma forma persistente, levados a conhecer memórias e flashbacks da vida de Tomaz, onde surge, na maior parte das vezes Miriam (Angeliki Papoulia).
Progressivamente vamos entendendo que o subconsciente de Tomaz carrega um peso emocional e físico, que o sufocam e obliteram o seu discernimento.

Tomaz (Alec Secareanu) em Amulet (2020) Foto ©IMDB
Magda é-nos apresentada como uma mulher sofrida, sensível, uma autêntica mártir às mãos da própria mãe, que ainda que doente, a agride fisicamente e subjuga a uma vida miserável. Tomaz é incapaz de ignorar e não consegue deixar de sentir uma determinada responsabilidade em proteger Magda, e de a libertar.

Tomaz (Alec Secareanu) e Magda (Carla Juri) em Amulet (2020) Foto ©IMDB
Após algumas cenas verdadeiramente gore, tais como o esmagar de um morcego que surge no fundo de uma sanita, vão surgindo momentos, especificamente lá colocadas, recorrendo ao velho, ainda que sempre reativo, jumpscare. Mesmo os mais céticos, foram vítimas do truque.
Aqui, é desde já essencial perceber que o pace do filme é construído com base num aceleramento do decurso da narrativa, mas que também leva consigo mais e mais dados, ofuscando a beleza que podia viver na simplicidade. Demasiadas ideias são inseridas na trama, e muitas são deixadas ao acaso, levantando questões múltiplas.
No meio dos vários flashbacks, e já num ponto da trama muito mais aceso e intenso, há um que assombra Tomaz, e está permanentemente a revisitá-lo. É uma cena em que ele encontra Miriam na estrada e oferece-lhe ajuda, mas acaba por violá-la.

Miriam (Angeliki Papoulia) e Tomaz (Alec Secareanu) em Amulet (2020) Foto ©IMDB
Mas, é aqui que nos é revelado o verdadeiro women power do filme. A Freira e Magda, estão unidas, e com o uso de um amuleto, penitenciam os violadores e sugam-lhes o mal, usando-o contra eles próprios. A mãe de Magda, é afinal um homem, e, numa das cenas mais chocantes, vemo-lo a parir um morcego, mas, Tomaz não escapa exatamente ao mesmo destino.
Há uma situação que nos reporta a um episódio da série The Blacklist, em que uma médica vítima de violação engravida homens que tinham feito as leis contra o aborto, com o esperma do violador dela. Aqui, Garai cria um plano absolutamente genial em que, com o objetivo claro de ferir toda e qualquer suscetibilidade, não poupa na mensagem nem na forma como a transmite. É, sem dúvida, daqueles filmes que nos colocam em perspetiva e em reflexão.
Num trabalho de excelente qualidade, com atores fantásticos, e um guião bem elaborado, pode ter pecado pelo excesso de informação mal resolvida e enquadrada, mas que primou pela excelência da mensagem final.
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Licenciada em História da Arte, apaixonada por arte e fotografia, com o lema: a vida só começa depois de um bom café, e uma pintura de Velázquez.