Quarentena

Carla Mendes Côrte-Real – Quarentena 2020
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16 de Novembro, 2020 0 Por Isabel Pinheiro
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Também o tempo torna tudo relativo.

Este artigo foi inicialmente publicado há mais de 3 anos - o que em 'tempo Internet' é muito. Pode estar desatualizado e pode ter incongruências estéticas. Se for o caso, aceita as nossas desculpas.

Quarentena 2020

 

Carla Côrte-Real passou os primeiros meses do confinamento, totalmente dedicada à sua arte, também ela assustada, receosa do que poderia acontecer, recolheu-se e deixou-se levar pela imaginação e pela força da sua angústia oferecendo-nos agora diversas obras, todas elas representativas do que Portugal e todo o resto do mundo tem vindo a sofrer.

Pintou como se o mundo fosse acabar!

O que era verdadeiramente importante para Carla Corte-Real era pintar, registar o que se passava com ela…e com o mundo. Não pensava sequer em sair. O sair, fazia-a logo recuar.

O País estava no sinal vermelho! As cores começaram a sair meio alucinogénicas. Depois o vermelho tomou vida e força, forte e vibrante. O Covid roxo. O amarelo luz e finalmente o verde de esperança.

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

As suas obras tornaram-se também numa homenagem a todos os países, mais ou menos próximos, que sofreram e continuam a sofrer, tal como nós os efeitos do tal vírus, que ninguém conhece, ninguém vê, ninguém sente antes de ele se ter infiltrado em nós.

As cores da bandeira de cada país sobressaem nas suas obras, como que se quisessem dizer “nós ainda aqui estamos e vamos continuar!” .

Os vermelhos tão presentes na sua obras, refletem a força com que todos enfrentamos esta “guerra” invisível.

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

Esta exposição, embora relacionada com um tema pesado, transformou-se num hino à alegria tão necessária nesta fase cinzenta, mostrando-nos aquelas cores fortes e alegres aliadas às técnicas e outros materiais usados pela artista, e mais uma vez, Carla Mendes Côrte-Real não nos deixa desiludidos, pelo contrário, saímos de alma cheia, com força para enfrentar o futuro.

Quisemos saber um pouco mais sobre Carla Mendes Côrte-Real, artista plástica há vários anos; formou-se em Pintura, Desenho e História de Arte no ARCO e Desenho na Sociedade Nacional de Belas Artes; embora já tenha tido outras ocupações durante a    sua vida, a pintura e as artes sempre foram uma presença constante.

Como a própria diz, a arte manifesta-se de várias formas e não é só pintar um quadro que a representa, ela manifesta-se na nossa vida de tantas e diferentes formas, no nosso dia-a-dia.

Pintar para Carla Mendes Corte-Real não é um processo calmo, pelo contrário, até conseguir encontrar o seu caminho para a obra que pretende fazer.

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

Pintar, para ela é registar aquilo em que o seu estado emocional se encontra, no momento, a pintura é um registo do que se está a passar na vida, no mundo, é mostrar através da pintura a sua vivência;  considera ser essa a sua obrigação como artista e quanto mais forte é a emoção mais forte é o registo do que está a fazer e torna-se muito mais interessante. É quase uma “luta” entre os dois o que torna muito mais desafiante todo o processo.

Gosta de trabalhar com materiais “com vida”, que já tiveram alguma vivência, já têm a suas rugas, como um pedaço de madeira que pode apanhar na rua mas que olha para ele e percebe que lhe diz alguma coisa, há ali quase uma   cumplicidade, acontece ali   alguma fusão entre ambos e que lhe permite “conversar” com a peça de forma quase íntima e, citando Carla Corte-Real “as peças falam comigo”,  “ou há cumplicidade ou não me diz nada”.

Não quer dizer que não a pinte mas não existe aquela fusão de sentimentos. É quase como “ter sexo, só por ter” ou “fazer amor verdadeiramente”.

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

Perguntámos a Carla Côrte-Real se nunca sente a aflição de ver uma tela ou uma peça à sua frente e pensar “o que vou fazer com isto?”. Para ela isso não é um problema, pois defende que há sempre um  caminho que é “começando”, pode começar com uma pincelada amarela e no final até ficou tudo preto, mas é preciso dar a primeira pincelada; começar é o mais importante, deixar-se ir…. Isso é o início do processo e pensar positivo, tendo a certeza que pode sempre recomeçar, modificar o registo, mudar tudo, se lhe apetecer.

Acrescenta ainda que cada trabalho é uma janela que se abre sobre a nossa identidade. Somos esponjas de formação, informação, conhecimento, sentimentos e emoções. Por isso, cada obra é quase uma guerra entre energias               inconciliáveis que vão passando do caos à ordem, revelando o íntimo do artista, tornando-o visível.

Não se incomoda se for só acumulando camadas de tinta, no final são registos que se vão formando, e no fim, é obrigatório que esteja bem feita, tecnicamente equilibrada, e aí, sim….chega-se ao “orgasmo   da peça”, atinge-se o êxtase e ao olhar para o trabalho agora finalizado, pensa-se “É ISTO!!!!”

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

E todo este processo é viciante, e de tal forma envolvente que não consegues parar, acabas de terminar uma obra, mas já queres começar outra e é isto que vai fazendo a “construção” de um artista, é o que o revela, diz Carla.

O registo de escrever é único, o de fazer uma escultura, o de fotografar, tudo são artes únicas em que se exprimem registos, seja qual for a área.

“Sempre que um homem sonha, o mundo pula e avança” já dizia António Gedeão e Manuel Freire.

Carla Mendes Côrte Real - Quarentena

Carla Mendes Côrte Real – Quarentena

Toda a vida, desde a pré-história sempre houve uma necessidade de registar a nossa vida, seja escavando na parede, seja na pedra, mostrar como vivemos e todos sempre fomos registando, cada um à sua  maneira, conforme a época e a mentalidade a história da nossa vida, a forma como se vive e vai-se com isso construindo a história da arte.

Um artista não se faz num dia mas quando chega ao final da carreira e olha para trás, toda a sua vida foi um processo em que fez coisas de que gostou menos, outras de que gostou mais, mas tem que ter a certeza e essa para Carla Corte-Real é indiscutível “tem que se ter a certeza de que se deu o seu melhor”, seja em que área for.

E Carla Mendes Côrte-Real ainda tem muito para mostrar e continuar a dar sempre o seu melhor.


Nas Oficinas de Formação e Animação Cultural, em Aljustrel (Facebook) até dia 21 de novembro37

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Jaime Roriz Advogados Artes & contextos