ProjectoMAP 2010–2020
O Museu Coleção Berardo brinda-nos, desde setembro passado e até 10 de janeiro próximo – com curadoria de Alda Galsterer, curadora e galerista e Verónica de Mello, curadora e arquiteta – com o PROJECTO MAP (Mapa de Artistas de Portugal) 2010-2020 – mapa ou exposição, uma celebração da arte em Portugal.
Começando pelo princípio:
Em 1969 quatro artistas suíços, Daniel Spoerri, André Thomkins, Karl Gerstner e o alemão Dieter Roth, convidaram um grupo de artistas seus amigos, a convidarem por sua vez, amigos seus e estes, outros seus amigos, realizaram, em colaboração com os curadores Harald Szeemann e Karl Ruhrberg, a exposição a que chamaram Freunde – Friends – Fründ. Reuniram assim mais de 400 peças de cerca de 50 artistas, naquela que ficou também conhecida como Lawinenausstellung (exposição avalancha).

Josef Albers, Arman, Joseph Beuys, George Brecht, John Cage, Christo, Marcel Duchamp, Méret Oppenheim e Günther Ücker, são alguns dos nomes que nela participaram, juntamente com os quatro organizadores.
Assim inspirados, em 2009, quatro curadores portugueses, grupo autonomeado Colectivo de Curadores, convidaram quatro artistas, Pedro Barateiro, Ana Pérez-Quiroga, João Paulo Serafim e o duo Sara e André, dando origem ao ProjectoMAP, um projecto de curadoria não lucrativa.
O Mapa começou a crescer a partir do convite direto de cada artista já integrante a dois artistas do seu universo pessoal, repetindo-se a cada ano e criando assim um efeito bola de neve, que em 2020, dez anos depois, já integra um conjunto de 360 artistas.
Esta exposição celebra a primeira década de um projeto potencialmente interminável, numa estrutura – nas palavras da curadoria – “virtual e relacional de arte contemporânea portuguesa, [permitindo] uma leitura horizontal do panorama das artes portuguesas”.

Um coletivo, que não o é em termos tradicionais, reúne artistas que representam um universo heterogéneo, híbrido e divergente, que transgride todas as regras da normalidade, determinando assim a sua riqueza ímpar.
O projectoMAP é uma ideia.
É a ideia que surge do desiderato de documentar os caminhos da arte em Portugal e que para isso dispensa os académicos e os críticos e recorre aos artistas, habitualmente relegados a figurantes na crítica artística e mais, na seleção das personagens da História que escrevem, devolvendo-lhes o protagonismo que lhes é devido.

Como qualquer grupo de seres humanos este é um grupo repleto de individualismos, de idiossincrasias. Mas este grupo de seres humanos tem a particularidade de olhar o mundo e a sociedade e transferir aquilo que recebe e dar-lhe forma, cor, textura, volume, de poder representá-los.
Aqui estão representadas de forma arbitrária dez gerações de artistas que involuntariamente, e pelas suas realizações constroem um mapa orgânico da evolução da arte em Portugal na última década.

Um traçado de geração após geração, em que a idade para nada conta e apenas importa a presença de quem e quando. O que cada um representou, as marcas que deixou da sua presença no tempo de um ano, de uma estação, durante uma crise, a propósito de uma tragédia ou de uma revolução científica.
Marcas traduzidas nas obras que contam histórias da História.

Cada artista, ao escolher dois dos seus pares, dois criadores com os quais se identifica, cuja obra aprecia e/ou que por motivos de sensibilidade própria, considera merecer um lugar neste mapa está a adicionar ao mapa mais dois intérpretes.
Se é verdade que a “voz” dos artistas é a sua obra, não é menos verdade que a sensibilidade que o artista incorpora, permite-lhe ler a arte dos outros de uma forma única e temperada pela sua natural e humana condição de comparação e confronto, mas desprendida dos cânones da crítica “oficial”.
Como representaria ou diria eu isto? O artista em geral, faz uma leitura metalinguística da expressão dos seus pares. Quando o artista conhece a obra e principalmente a alma e o ser de um outro, a observação que faz de uma peça é íntima e vai ao âmago da criação daquela.
Quando um/a artista observa a obra de um/a amigo/a, observa o seu momento gravado na sua história e no seu caminho.

A escolha de cada um/a é tão “justificável” e óbvia aos olhos da sua única e insondável sensibilidade, quanto incompreensível perante catalogações bibliográficas.
Esta flexibilidade permite e até assegura, como no caso de uma escolha coletiva, um traçado que acaba por revelar, não uma ordem ou um estado de coisas, mas uma multiplicidade de caminhos que não revela nem o seu início nem o seu termo.
Com o alargamento do grupo, vai-se perdendo qualquer traço de identidade, qualquer caraterística ou conjunto de caraterísticas catalogáveis e empacotáveis, ao mesmo tempo quem quase inevitavelmente, nos induz ao aforismo aristotélico “o todo é maior do que a simples soma das suas partes”.
Não há uma arrumação possível deste caos; não há uma compartimentação nem uma ordem, uma hierarquia ou encadeamento.

A abrir o passeio pela exposição, há uma ala dedicada à exposição Freunde – Friends – Fründ, de 1969 nas Kunsthallen de Berna e Düsseldorf, (1ª foto no topo) com fotos, cartas e diversos objetos trazidos de 1969 para aqui.
Depois,… bem, depois percorremos o extenso corredor ladeando espaços onde encontramos obras de pintura, escultura, fotografia, vídeo e instalações, encontramos catálogos originais; entrevistas a artistas, a diretores de museus, galeristas e curadores; cartas, documentos históricos e relatos pessoais, que compõem apenas numa parte representativa deste mapa de dez anos.
Pelas suas caraterísticas, esta “seleção” insubordinada de artistas e obras, projeta de uma forma verdadeiramente honesta e sem sujeição a qualquer praxis, imune a tendências e orientações, o Zeitgeist do período que abraça, a década 10 do seculo XXI.
O Projeto MA.P, apresenta-se ainda como uma plataforma online interativa, (aqui) onde os visitantes podem conhecer o portfólio dos artistas representados e mesmo os Ateliers de alguns deles.
Ajuda-nos a manter viva e disponível a todos esta biblioteca.

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Jornalista, Diretor. Licenciado em Estudos Artísticos. Escreve poesia e conto, pinta com quase tudo e divaga sobre as artes. É um diletante irrecuperável.
