Sandmann

“Chegar” de Sandmann Côrte-Real
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4 de Junho, 2021 0 Por Isabel Pinheiro
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Também o tempo torna tudo relativo.

Este artigo foi inicialmente publicado há mais de 2 anos - o que em 'tempo Internet' é muito. Pode estar desatualizado e pode ter incongruências estéticas. Se for o caso, aceita as nossas desculpas.

Sandmann Côrte-Real

 

“Quando O Espelho Reflete A Imagem Do Outro”

Este poderia ser o mote para a exposição “Chegar” de Sandmann (Francisca Côrte-Real), apresentada em Lisboa.

Ao contrário do que acontecia na sua anterior exposição “Casa Cheia”, em que a artista se retratava a si própria nas suas diversas vivências, já através do espelho; aqui Sandmann sai de si própria, da sua própria realidade para se focar nos outros, nas suas próprias vivências, nas suas realidades num contexto tão longe quanto possível de si própria.

 

Exposição "Chegar" de Sandmann Côrte-Real

Exposição “Chegar” de Sandmann Côrte-Real

 

Segundo Sandmann, “é também através da arte que conseguimos chegar ao outro, conhecer os seus pontos de vista, criar empatia pelo próximo, por outros povos, outros costumes sem, de facto, precisarmos de estar junto deles ou os conhecermos pessoalmente”.
Basta que nos foquemos mais no outro e, não tanto, em nós próprios.

A prova disso é esta exposição em que a artista, influenciada por dois filmes que a fizeram sentir a vida de outra forma, nos apresenta obras com a vivência de tribos indígenas, pelas quais consegue sentir uma profunda empatia sem, na realidade, as conhecer pessoalmente. É apenas preciso que consigamos “entrar” mais no outro, na sua vida, nos seus costumes porque há tantas realidades diferentes, não menos importantes que a nossa, apenas diferentes e é isso que o artista descobre ao focar-se nos outros e não em si própria.
Aliás, o artista é sempre influenciado pelo que se passa à sua volta, seja à distância seja perto de si.

 

Exposição "Chegar" de Sandmann Côrte-Real - Artes & contextos

Exposição “Chegar” de Sandmann Côrte-Real

 

“Somos sempre o reflexo de tudo o que passa por nós”.

E, nesta perspetiva, “quando nos vemos ao espelho não nos vemos a nós mas sim ao outro” acrescenta Sandmann.
E isso é o que se passa com o espelho, o que está por detrás do nosso reflexo, provavelmente, é mais importante do que a nossa imagem lá refletida. Basta que estejamos atentos.
Neste contexto, a pintura em espelho foi a escolha desta artista onde os papéis se inverteram, ou seja, nós vemo-nos refletidos através do olhar do outro.

É possível, e neste caso, o espectador também quase que participa na obra ao ver-se refletido no espelho e na própria obra.
Também ao pintar os indígenas, vendo-se ao espelho, a pintora se sente transportada para o interior daquele personagem e da sua vivência dentro daquela tribo.

“A pintura é um espelho que continua a refletir o artista e o espectador; sendo que ao pintar no espelho há sempre uma reflexão sobre nós, o que somos, e o que projetamos sobre nós”. diz Sandmann.
Prova disto mesmo, é o que se passa com “Narciso” o personagem do livro O Alquimista, em que Narciso vive só para se admirar a si próprio no lago vendo-se ali refletido como se de um espelho se tratasse, até ao dia em que cai ao lago e morre. Toda a floresta mergulha numa profunda tristeza e as fadas da floresta perguntam ao lago, “percebemos que estejas triste pois tu eras quem mais convivia com Narciso, com a sua beleza”.

 

Exposição "Chegar" de Sandmann Côrte-Real - Artes & contextos

Exposição “Chegar” de Sandmann Côrte-Real

 

“Narciso era belo?” perguntou o lago. “Sim – responderam as fadas, – era o mais belo de todos nós. Mas tu nunca viste Narciso?” perguntam as fadas.
E o lago responde “eu nunca vi Narciso, apenas me via a mim refletido nos olhos dele”, o lago transformou-se e aumentou de tanto chorar de tristeza.
Também o lago se via sempre através dos olhos de Narciso, como nós nos vemos sempre através do olhar dos outros.

A realidade nem sempre é o que parece e por isso, tantas vezes a vida se torna tão dúbia.

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Jaime Roriz Advogados Artes & contextos