SBSR.FM em Sintonia
Nos dias 17 e 18 de dezembro, o Altice Arena recebeu o primeiro grande festival de música, pós quarentena, mas em plena pandemia. O desafio era, logo à partida, gigantesco. Com esforços reunidos, com o desejo de criar algo único e conciso, o SBSR em Sintonia é tudo aquilo que se pode desejar de um festival, durante uma pandemia mundial. Com regras estritas e apertadas, um line up somente nacional e salas esgotadas, foram o resultado de meses e meses de trabalho, de diversas equipas e os variados artistas. Entre três palcos, e um ciclo de conferências, foi reunida música portuguesa com nomes tão sonantes como Capitão Fausto, Prof Jam e Benji Price, Papillon, Conjunto Cuca Monga, B Fachada, e muitíssimos outros.

Como fã insaciável de música, que sou, e fã persistente de muitos dos artistas que por lá passaram, foi uma oportunidade de poder voltar a viver a música e o espírito festivaleiro em primeira mão. A organização foi incrivelmente bem conseguida, com entradas e saídas bem organizadas, zonas de consumo interiores, acesso a zonas exteriores, tudo coordenado de forma a proporcionar dois dias bem passados.

No auditório (Moche Talks), «A Indústria da Música no Contexto Atual», e passando a citar a nota de imprensa: «Depois de demasiados meses de paragem forçada e de indefinição sobre o futuro da Cultura em gera e, em particular, sobre o regresso da Música ao vivo, impõe-se um momento de reflexão, para que seja possível olhar em frente e criar as condições que possam vir a ser necessárias perante um cenário, para já, em aberto». As seis conferências distribuídas ao longo dos dois dias de festival, permitiram criar três painéis repletos de diversos profissionais da cultura da música e do audiovisual. Foi possível ouvir diferentes testemunhos e perspetivas sobre o panorama atual, tal como olhar para o futuro da música de diferentes prismas, o que pautou o festival com uma componente didática e educativa, tão necessária nos tempos correntes.

O primeiro concerto ao qual assisti, no dia 17, foi Ganso, na Arena. A banda, composta por João Sala, Thomas Oulman, Miguel Barreira, Luís Salamandro e Gonçalo Bicudo, que já nos tem habituado a excelentes performances, abriu caminho para uma noite em cheio, na sala principal. Com a ajuda de Fernão Biu (Zarco), no saxofone, puseram o público a bater o pé, numa sala ainda a meio gás. Seguiram-se as senhoras e senhores, do Conjunto Cuca Monga, na sua primeira performance, enquanto coletivo, ao vivo.
A quarentena foi profícua para a produção de um belíssimo álbum, «Cuca Vida», fora do comum, mas, que no fundo, une os sons e as musicalidades de todas as bandas e artistas integrantes. Para quem não está familiarizado com o conceito, a união surge dos membros da discografia Cuca Monga, e neste conjunto podemos ver integrantes das bandas Capitão Fausto, Ganso, Zarco, Reis da República, e solistas, tais como Luís Severo e Rapaz Ego (Luís Montenegro), entre outros tantos amigos. Ao longo de 45 minutos vimos coroada uma amizade bela, entre um grupo de jovens apaixonados pela música, e uns pelos outros.

Com fatos cheios de cor, muita instrumentalidade, coro e dança, Cuca Monga montou uma festa, e provou que é possível celebrar a vida, mesmo em períodos conturbados. Foi memorável e é imperativo que volte a acontecer!
A noite segue com o Rei do Alto Minho e Trás-os-Montes, a personificação do trap pimba, Chico da Tina. Vastamente conhecido, pela sua presença no mundo digital, pela sua peculiaridade, junta a concertina a sons do trap e underground, fazendo algo que, parecia tão mau, e que se tornou tão bom. Sem nunca perder a sua vincada pronuncia nortenha, um slang muito próprio, criou, com Fredo e outros tantos compinchas, um concerto onde houve palco para risada, sem nunca descorar os fãs mais afitos que proferiam cada letra com ele. Vestido de mágico, com um fato 70’s, de boxers ou de calções e o Pedro Alexandrino ao pescoço, é impossível resistir à sua presença vívida e intensa em palco. Ele disse Chico, e nós dissemos Tina.

A noite, ainda no palco principal, terminou com o brilhante duo do hip-hop português, Prof Jam e Benji Price. Na estreia da apresentação do álbum «System», atuaram, em consonância com o público, sentados, num two man show, fãs ao rubro, e boa música. Uma forma incrível de terminar a primeira noite de festival.

O segundo e último dia de SBSR em Sintonia, começou, para mim, com Filipe Karlsson na Sala Tejo (Palco Santa Casa). No seu concerto de estreia, o também membro da banda Zanibar Aliens juntou Carl Karlsson (Zanibar Aliens), Diogo Braga (Zanibar Aliens), Martim Seabra e Guilherme Proença, e com a grupeta pronta lançou-se. O luso-sueco já era bem-afamado pelos seus sons cheios de groove e uma vibe que nos remete aos anos 70. Uma musicalidade intensificada pelos teclados, guitarra, um bom baixo, e instrumentos de percussão, Karlsson, foi amado e adorado pelo público que foi incapaz de ficar sentado, aplaudindo o jovem músico de pé bem antes do final do concerto. Emocionante e divertido, queremos ver Filipe Karlsson mais e mais vezes!
De novo na Arena, a sala estava cheia e preparada para receber, de braços abertos, Capitão Fausto, banda composta por Tomás Wallenstein, Salvador Seabra, Francisco Ferreira, Manuel Palha e Domingos Coimbra. Ao longo de já alguns anos de carreira, têm vindo, de forma consistente, a construir um som único e próprio, levando consigo fãs dedicados, igualmente ansiosos e emocionados por ver os cinco rapazes. Depois de «Sol Posto», o filme concerto que esgotou salas de cinema por todo o país, a banda trouxe algumas remasterizações de músicas, e clássicos. Facilmente, pôs o público em uníssimo e de pé, a cantar cada palavra com o front-man. Foi um regresso caloroso e bonito, que nos encheu o coração e nos pôs a dançar, como antes. À falta do anual concerto natalício dos Capitão, o concerto termina e ecoa na Altice Arena a «Last Christmas» dos Wham!

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Durante dois dias, mesmo com máscaras, distanciamento físico, álcool gel, medidor de temperatura, foi possível esquecer e reabastecer o espírito, colocando-nos numa dimensão de amizade, amor e muita música. Felicidade percorria os corredores da arena, mostrando-nos que é possível viver a cultura, dela usufruir e continuar a fomentá-la, mesmo perante este tempo mais adverso. Parabéns à organização e aos artistas que nos deram, em 48 horas, um fecho lindíssimo de um ano, e uma promessa de ano melhor.
Todas as fotos de Inês Barrau, gentilmente cedidas por Arte Sonora
Licenciada em História da Arte, apaixonada por arte e fotografia, com o lema: a vida só começa depois de um bom café, e uma pintura de Velázquez.