O Ragtime
Para muitas pessoas, a simples menção do termo Ragtime sugere o nome Scott Joplin. Isto acontece ptalvez por se tratar do compositor e intérprete mais celebrado do estilo de música que veio a ser conhecido como Ragtime. Uma das suas peças mais tocadas e adoradas, The Entertainer, composta em 1902 para piano solo evidencia diversas características deste estilo de música que iremos explorar neste artigo.
A música Ragtime pode ser considerada ma forma primitiva de jazz que dominou a cena do jazz norte americano desde o final do século XIX até ao início do século XX. O que pode, talvez, ser considerado como parte do encanto permanente do Ragtime é o facto de ser uma combinação de música das culturas Africana e Ocidental.
Uma importante característica da música Afroamericana era uma vertente rítmica chamada “síncope”. Isto significa música que não é tocada ao ritmo de determinado compasso, mas em vez disso “fora do ritmo” criando uma sensação de cadência, balanço e movimento.
Quando esta música se fundiu com a música mais tradicional e um tanto ou quanto linear da banda militar tradicional da cultural ocidental, nasceu o Ragtime.

Esta fusão de culturas apresentava-se normalmente sob a forma de peças de piano que tinham caracteristicamente o padrão de marcha constante de acordes de acompanhamento na mão esquerda do piano, enquanto a mão direita tocava a melodia sincopada. O estilo da mão esquerda a que me refiro é também conhecido como a técnica de “Stride”, desenvolvida por pianistas no virar do século para com um piano, recriar o som de uma orquestra de jazz mais completa.

A execução de Stride envolve o baixo do acorde a soar na parte mais baixa do piano, nas principais batidas do compasso, enquanto que os acordes estão nas batidas mais fracas em direção ao meio registo do instrumento. Não é uma técnica fácil de dominar mas é um dos elementos chave do piano no Ragtime.
As melodias, principalmente as de Scott Joplin, eram extremamente atrativas e cativantes. Isto devia-se em parte ao ritmo sincopado, mas também à construção cuidadosa da música combinando uma mistura irresistível de movimento a salto e passo.

No excerto acima é mais fácil perceber as caraterísticas do Ragtime que mencionei nos parágrafos anteriores. Esta é a abertura da famosa composição The Entertainer.
https://youtu.be/fPmruHc4S9Q
Aqui é possível ver o “stride” na mão esquerda e a melodia na mão direita. De notar que a mão esquerda, neste caso, também está a tocar em harmonia. Joplin também divide a melodia, de forma inteligente, em dois registos diferentes com o primeiro compasso e meio marcado como “piano” (suave), depois o registo mais alto marcado como um “crescendo” (a ficar mais alto), até “forte”.
O fraseado regular é outra caraterística de várias peças de ragtime, cada uma aderindo a um comprimento de frase de compasso quatro mais quatro. Esta regularidade faz com que a música seja mais fácil de ligar, já que esta apresenta um padrão suavemente previsível que se mantém atrativo por várias décadas.
A harmonia também sustenta este fraseado e ainda que várias melodias Ragtime sejam bastante cromáticas em partes, a harmonia é decididamente tónica/dominante. Isto dá à peça uma sensação harmoniosa bastante sólida sem se desviar muito dos limites tonais familiares.
Dito isto, Scott Joplin, Jelly Roll Morton, Joseph Lamb ou James Scott para salientar os compositores de Ragtime mais importantes, não se limitavam de modo algum ao sistema tonal, eles exploravam-no e utilizavam-no de maneiras coloridas e imaginativas. Foi o ouvido apurado que estes, entre outros compositores da altura possuíam que criou um estilo musical cativante de que ainda desfrutamos mais de um século depois da sua invenção. “Elite Syncopations” (Joplin,1902), é um exemplo formidável, não só da criação inteligente e inovadora de harmonia e melodia num rag, mas é também um indicador de que Joplin não era, como muitos comentadores brancos da altura afirmavam, um simples vendedor de boas canções.
https://youtu.be/A44QDL-K-bY
Neste rag, Joplin estrutura a peça da seguinte forma: Introdução – Lá Lá Si Si Lá Dó Dó Ré Ré. Joplin não está a utilizar uma forma regular e previsível, mas uma forma estendida que lhe permite mostrar os seus próprios poderes de criação e demonstrar que o Rag não é uma forma musical limitada. Harmonicamente ele começa em Fá maior, modula (muda de clave) para Si bemol maior para a secção “Dó”, e permanece lá sem voltar à clave tónica. As escolhas de Joplin podiam ter sido muito diferentes e um rag perfeitamente funcional podia ter sido composto de uma forma mais simples, mas não é essa a motivação de Joplin. Joplin, talvez mais do que outros compositores de Ragtime, estava desejoso para mostrar o seu conhecimento da música da Arte Ocidental no seu uso da harmonia, cromaticismo e estruturas mais complexas.
Joseph Lamb foi um contemporâneo de Joplin e reza a história que o conheceu em 1907 quando foi à editora de Joplin (John Stark & Son), para comprar uma cópia da sua música. Quando se ouve ou toca a música de Lamb, é fácil perceber porque é que Joplin ficou impressionado com este jovem compositor. Lamb pegou nas ideias que Joplin tinha feito suas e desenvolveu-as e estendeu-as. Uma característica do trabalho de Lamb é a utilização da “sequência” harmoniosa que ele utilizou para desenvolver as suas composições. É também possível ouvir que Lamb contornou os confins do fraseado regular de quatro compassos para extensões mais complexas que deram uma sensação única à sua música.
A música Ragtime oferece uma combinação fascinante e envolvente da Música Clássica Ocidental com Jazz inicial. O 2/4 subjacente da marcha 4/4 serve de dinâmica rítmica para cada Rag e é sobreposto com uma brilhante gama de melodias inspiradas que fundem o cromatismo suave com a síncope elegante. Estruturalmente modelado por Música Clássica anterior, o Ragtime criou música nova a partir da antiga, estabeleceu formas e no processo deu-nos um género único de música popular. Apesar de talvez não se ouvir Ragtime tão habitualmente como há um século atrás, houve um ressurgimento de interesse pela música após o filme de 1973 “The Sting” que protagonizou adaptações de vários Rags de Joplin.

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Este artigo foi traduzido do original em inglês por Inês Carvalho
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