A Pintura Íntima e Púdica de Juliette Lemontey
Apesar de sua suavidade, da sua absoluta e total ausência de segundas intenções, as pinturas de Juliette Lemontey quase sempre dizem algo um pouco íntimo demais. Não se sujeitam a nenhuma proibição, nem se afastam do pudor, mas abrem-se para algo que pensávamos não ver, fosse pela luz muito intensa nas ondas, ou simplesmente porque ali, deveria ter sido a noite; agora é dia, o dia pleno, a propósito.
O que assim é apresentado, são os rostos atrás de um cotovelo, cabelos desgrenhados pelo sono, cabelos despenteados pela mão que acabou de passar, corpos, umas vezes completamente lânguidos, outras, caídos na areia, ombros nus, a pele sem amargura, traços finos de uma boca fechada, a sinuosidade de um peito, uma carícia, um momento íntimo, o padrão de um vestido de verão.
Nada sério, e nada mais sério do que aqueles seres que conhecemos ao vê-los como parte da intimidade que eles próprios nunca imaginaram. São apenas pequenas coisas, mas quem pode dizer que já se viu antes de costas ou de olhos fechados? Quem se conhece no momento em que cai no sono? Quem se importa em saber a extensão do seu rosto quando mergulha na água do banho? Quem observa as madeixas dos seus cabelos ao vento?
Sabemos que o que vemos nestas telas, parece um pouco momentos roubados. Não por nós, autores do olhar, nem tão pouco pelo artista, mas por uma espécie de acaso, feito revelador de uma fragilidade num momento inesperado. Não há ainda assim sobressalto, nada que venha perturbar o olhar que se prende.
Temos o tempo todo para observar: uma vez diante do facto consumado, termina a pressão.
E quem são então essas pessoas? Impossível saber. O que podemos adivinhar é a proximidade dos corpos no seu relativo abandono à pintura. A tela que Juliette Lemontey utiliza é sempre crua, levemente áspera, como linho lavado há muito tempo.
Ela recorre tanto aos olhos quanto à mão, experimentando uma sensação que é tanto de fricção quanto de carícia. Todo o corpo reage a este sentimento, como na presença de outra pessoa sob os lençóis.
Queremos virar, rolar e rebolar entre os lençóis que amarram, puxam e descobrem o corpo do outro – que de repente está frio e arrepiado – mas o que importa?
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