Midsommar – o Ritual
O último trabalho de Ari Aster resulta de proposta para que realizasse um filme que tivesse como base um conceito folk. “Deu” num filme de terror (ou nem por isso).
É um filme com toques muito gráficos, mas o terror é maioritariamente psicológico, todavia não sendo passível de ser categorizado apenas como terror, foi como tal que venceu, na votação do público, o MotelX 2019, realizado há duas semanas em Lisboa.
Mas também, é comédia negra e é uma mistura, é macabro, belo, forte é no fundo uma experiência total.
Ari Aster, mais conhecido pelo super aclamado Hereditary, dirige uma história que pode resumir-se à destruição de um romance, que desde o início indiciava ser difícil dar certo
Dani (Florence Pugh) e Christian (Jack Reynor) e os seus amigos Mark (Will Poulter), Josh (William J. Harper) e Pelle (Vilhelm Blomgren) dirigem-se à comunidade Hårga a que este último pertence, para viverem fisicamente a experiência da mais importante celebração nas comunidades pagãs nórdicas: o Midsommar, a celebração do solstício de Verão.
Os Hårga são uma comunidade com rituais ancestrais, habituados a ideias neles enraizadas e que por isso não são questionados, ao contrário do que se passa com quem vem de fora.
Ari Aster dedicou-se durante muito tempo a estudar as tradições dos povos nórdicos e criou uma base teórica muito sólida sobre o que queria retratar acerca dos ritos destas comunidades. Numerologia, música, trajes e rituais marcam o filme.
O realizador aborda também a questão dos valores enraizados na sociedade sueca não apenas dos antepassados, mas também atuais, sobretudo para a urgência de questionarmos as ideias que nos são incutidas antes que seja tarde de mais.
O espaço vital do filme – o local onde os que, segundo os Hårga, se situam na primavera da vida, dormem – é coberto de placas pintadas (por Ragnar Persson e que retratam o que era feito no período medieval), que nos vão dando pistas sobre o futuro das personagens.
À medida que vamos assistindo à destruição da disfuncional relação entre Dani e Christian, aquela vive uma experiência altamente catártica de descoberta de si mesma, encontrando na comunidade Hårga aquilo que não tinha visto em si quando se encontrava na américa rodeada do grupo dos seus supostos amigos.
A aceitação das emoções que até a este encontro ela tinha rejeitado confere-lhe o poder de aceitar o que lhe tem vindo a acontecer e isso permite-lhe tomar uma atitude face à sua relação amorosa com Christian.
O filme é de uma riqueza muito ampla não só ao nível dos figurinos, cenografia, música, uma obra de arte total, mas é também um filme de contrastes em que por oposição encontramos um minimalismo na paisagem.
O facto de a noite pouco pesar na história, permite explorar novos caminhos para o género de terror, uma vez que não se apoia nos sustos e surpresas surgidas da escuridão, mas sim num terror muito lento, que nos vai envolvendo até ao final.
Do elenco conhecemos Florence Pugh de Lady Macbeth em que ela faz um papel extremamente contido, por oposição a este em que Dani, é profundamente crua e exterioriza muito o que se passa na sua mente e à sua volta e Jack Reynor de Escritos Secretos .
Entre os propósitos de comédia negra e folk, Ari Aster considerou-o uma fábula ou, como afirma numa entrevista, “the wizard of Oz for perverts”, (“o feiticeiro de Oz para pervertidos”). Mas muito distorcida dizemos nós, orientando a atmosfera para o macabro que afinal transmite.
Midsommar é um exercício de cinema, que eleva o género de horror a um novo patamar impondo-se como uma experiência introspetiva muito forte a ser partilhada por quem assiste ao filme naquele momento.
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Estreia a 26 de setembro
Licenciada em História de Arte pela Faculdade de Letras de Lisboa. Apaixonada por histórias contadas na imagem, literatura do século XIX e artes decorativas. Defensora da liberdade no mundo da arte.