Variações
Encontrar, renovar, vou fugir ou repetir
Vou viver
Até quando, eu não sei
Que me importa o que serei
Quero é viverAmanhã, espero sempre um amanhã
E acredito que será mais um prazer
António Variações in Quero é viver
A freguesia de Fiscal, em Amares, comporta uma paisagem pitoresca e lírica, digna de qualquer romance de século XIX. Deveras inspiradora, aquela pequena terrinha, no norte de Portugal, viu crescer António Ribeiro, um génio sem precedentes. Ao longo de 1 hora e 40 minutos de filme, somos imediatamente transportados para o excentricíssimo dos anos 80, e para a vida do incomparável, Variações.
Uma produção da David & Golias, e realização de João Maia, o filme é protagonizado por Sérgio Praia, que interpreta António Variações. Desde logo, é percetível o caráter biográfico do filme, e a importância atribuída à infância de Toninho, como a sua mãe lhe chamava. Sempre aspirou uma vida em Lisboa, fugir do trabalho na fábrica e encontrar o seu eu. Desde pequeno, já cantarolava, pelos caminhos da floresta, Amália, a sua grande musa e inspiração.
Entre Nova Iorque, Amsterdão e Lisboa, Variações “variou”, mudou, inspirou e foi inspirado, deixando uma forte marca da sua presença. A interpretação que nos é oferecida por Sérgio Praia é simplesmente brilhante, cumprindo o papel de uma forma magnífica, e é-lhe reconhecido o esforço de aproximação ao timbre de Variações, tal como os mais pequenos trejeitos.
Há uma atenção muito especial, que é dada à forma como se desenrola a história que nos é contada: tentando não ser demasiado reveladora, ficamos a conhecer Ribeiro, antes de ser Variações, o maior molde de cada uma das suas criações, e que, tal como aspirava, gostava que viessem a ser “melhores que eu”. A riqueza da banda sonora, que o é por si mesmo, a “natural” também contribui para elevar um filme biográfico, a uma experiência sensorial que traz nostalgia, mesmo àqueles que não foram contemporâneos de António.
A dificuldade de se adaptar ao sítio, passou mais pelo sítio, se adaptar a ele, pois “Lisboa é que se vai adaptar a mim”. Desde a Valentim de Carvalho, até à sua autonomia musical e sucesso, foram longos anos de trabalho árduo por parte do barbeiro, como gostava de se chamar.
A presença de Fernando Ataíde (Filipe Duarte), o fundador da revolucionária discoteca Trumps, é essencial para traçar a maior história de amor de Variações. Com momentos que nos levam às lágrimas, que são equilibrados com alguns episódios mais ficcionais, prometem deixar-nos de coração nas mãos.
O guarda roupa é simplesmente irrepreensível, extremamente bem conseguido e com conjuntos icónicos inspirados diretamente do styling do próprio Variações
A sua casa, de paredes verdes, repleta de loiça e prateleiras com pequenas estátuas típicas, foi bem conseguida e permite, que quando estamos a ver o filme, descolamos do assento e somos convidados a entrar naquele acolhedor lar.
As cores vivas, a dinâmica das luzes, as sombras, os focos as filmagens dinâmicas são atraentes ao olhar, e são uma das estrelas do filme. É importante olhar para os contrastes de cor, e a forma como a paleta corresponde às berrantes cores que caracterizam a época, mas a escolha do guarda roupa, principalmente de Variações, também reflete um estado de espírito emocional.
Um filme com pés e cabeça, com um elenco de luxo, personagens bem interpretadas, com tudo aquilo de bom que podemos reconhecer a uma biografia, em filme. É impossível não murmurar a “Erva Daninha Alastrar”, bater com o pé durante o “Anjo da Guarda”, ou libertar a tensão ao ouvir aquela rockalhada do “Toma o Comprimido”.
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Ele é um prazer estético, ele é um musical, ele é um estandarte da unicidade, ele é o brilho e o magnetismo, ele é o Variações.
Veja o trailer de Variações no IMDB
Licenciada em História da Arte, apaixonada por arte e fotografia, com o lema: a vida só começa depois de um bom café, e uma pintura de Velázquez.