
Museu das descobertas no MNAA em Lisboa0 (0)
21 de Agosto, 2019
Museu das descobertas no MNAA
A ida ao museu começa em casa, num café em qualquer espaço em que se tenha conhecimento de uma exposição à qual se tem interesse em ir. Ao pesquisar na internet acerca do evento a que se tenciona ir, ao ler as folhas de sala ganha-se algum contacto e começa-se a tomar um mínimo conhecimento do que se vai encontrar. Este é o procedimento natural das coisas. Bem, para a exposição Museu das Descobertas o melhor método podse não ser bem este…
Ao olhar para um dos outdoors espalhados pelas estações do metropolitano, tomamos contacto com um retrato da autoria de Gortzius Geldorp (1553-1618), que nos fita diretamente com um olhar sereno e que nos convida a percorrer o caminho até ao Museu Nacional de Arte Antiga. No entanto, o nome Museu das Descobertas facilmente pode enganar-nos.

Dafné transformada em loureiro (pormenor)
Podemos imaginar que se trata de uma exposição que evoca naturalmente as viagens marítimas realizadas pelos portugueses e o contacto com os povos que lhes são estranhos e que resultaria naturalmente em produções artísticas muito particulares que denominamos resultantes de um natural hibridismo. Ou então pensaríamos que seria uma“brincadeira”com a querela que tem acontecido sobre a possibilidade de um Museu das Descobertas existir efetivamente, e quais as consequências de tal situação. Ainda assim, quando chegamos ao museu somos confrontados um uma proposta bastante diferente, igualmente apelativa.
Ao tratar o museu como um local de constante descoberta a exposição divide-se em múltiplos momentos que nos apresentam diversas temáticas: Contemplar, Religar, Doar, etc. e todas elas representando valências próprias de um museu, permitindo ao visitante ter uma noção que até agora já se encontrava bem definida – O museu não pode ser apenas um repositório de peças, que possam eventualmente ser vistas apenas por uma elite.

Retrato de Homem Gortzius Geldorp

Gortzius Geldorp RetratoHomem – Radiografia
Ser confrontado com a obra de arte é o que motiva a existência do museu, e como tal o museu necessita do seu público. Não podemos ainda assim ignorar, todas as estações que se encontram por detrás deste momento final de contemplação: desde a recolha, investigação, identificação, classificação, restauro, conservação, etc., Ao mostrar-nos tudo isso, este “Museu das Descobertas” permite, ao mesmo tempo que ao longo do percurso, da mesma nos sejam apresentados, alguns momentos fundamentais da história da instituição MNAA.
Testemunhamos aqui uma museologia muito coerente e bastante dinâmica, não se limitando a apresentar as obras com um conjunto de textos entregues à leitura pelo público que passadas duas ou três salas se cansa e, simplesmente, avança. Recorrendo a meios audiovisuais, projeções, radiografias, entre outras propostas, há uma preocupação de mostrar o que normalmente não se vê. Desde a desmontagem das peças, os desenhos subjacentes, os métodos de restauro, – é dada ao público uma oportunidade de ter um entendimento mais claro face à função do museu.
De realçar a mostra de peças que raramente são mostradas e de diversas joias goesas, lacas japonesas (Namban e não só). Assim, o diálogo entre a cultura portuguesa e a dos povos com que houve contacto também teve lugar na exposição.

Bodhisattva
Gostaríamos de destacar com especial apreço a atenção dada também às artes decorativas que até há bem pouco tempo eram vistas como menores e que aqui podemos observar numa cadeira; na porcelana (não só chinesa, mas também europeia de várias localizações como Alemanha, França, e atual República Checa).

Conta de Rezar
Há também diversas peças muitíssimo curiosas como uma fabulosa conta de oração, que, com um trabalho maravilhoso, nos dá acesso a uma modalidade de oração de que muitas vezes nos esquecemos, já que pensamos sobretudo nos pequenos retábulos de viagem realizados em marfim (de que temos exemplares em diversos museus espalhados pelo país).

Cadeira de Braços
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Logo à entrada da exposição, local ao qual retornamos após visitar os diversos seus núcleos, somos confrontados com um catálogo cuja capa é em espelho. A arte realiza exatamente um jogo de espelhos, de constantes descobertas que podem ser de nós mesmos face às obras ou vice-versa.
Até 29 de setembro de 2019, no Museu Nacional de Arte Antiga.
Licenciada em História de Arte pela Faculdade de Letras de Lisboa. Apaixonada por histórias contadas na imagem, literatura do século XIX e artes decorativas. Defensora da liberdade no mundo da arte.