- Teresa Mendonça, nasceu nos Açores, em Ponta Delgada, e é nas próprias palavras artista desde sempre, “desde pequena que me fascina a pintura e tive a sorte de, desde muito cedo ter tido professores que me incentivaram.”
Estabelece uma relação intimista com os seus trabalhos, “à medida que se desenrola a obra, tenho a sensação de me encontrar muitas vezes, num estado de abstração”. E assim se define, e enquadra o campo da sua exploração, através do Expressionismo Abstrato, combinando, como afirma, “a intensidade emocional com a estética anti figurativa”.

Quando entrei no MAC – Movimento de Arte Contempoânea e comecei a passear ao longo das paredes pelas obras da pintora, percebi que estava a entrar num universo, onírico, metafísico, sem regras, mas pleno delas, sem fórmulas, mas intimamente formulado numa relação feérica com o mundo, um mundo próprio que se apresenta ao olhar da artista e só a ele.
Um mundo em que a realidade e o sonho se confundem, se enformam e se reconfiguram e que a pintora traduz num vocabulário interior, mas exógeno.

A linguagem primeira, a troca imediata com o observador é clara, alimenta o gosto e inebria os sentidos, mas a estética plena de beleza e equilíbrio formal e cromático, traveste a profundidade da mensagem num desafio intelectual e dialético de onde irrompe a inutilidade das palavras, se com palavras se tentasse participar neste diálogo.
Qualquer compromisso com a realidade é volátil como o devir da própria realidade, e o olhar da artista afasta-se e insinua-se numa procura indisfarçada de algo ainda por definir, mas de uma urgência sôfrega e impaciente.
Artes & contextos – Se alguém olhar para uma obra e confessar que não lhe transmite nada, apenas lhe agrada visualmente, essa obra cumpriu a sua missão?
Teresa Mendonça – Sim cumpriu, o observador é que pode não ser recetivo à mensagem.
O objeto define-se sem uma guia, na dimensão energética dos impulsos gestuais, gravada para lá da paleta de emoções e fantasias que a visão nos oferece.
A pintura de Teresa Mendonça transporta aquela maturidade que denuncia os longos anos de busca e exploração, mas de alguma forma imbuída de um encanto a tocar o pueril adivinhado na novidade que cada obra parece anunciar. Como se cada mancha de cor, ou cada traço, ou cada salpico fosse a primeira, da descoberta recente de um segredo.
É-nos oferecido aos sentidos algo que apenas os sentidos podem captar, frustrando qualquer tentativa de racionalização.

O geometrismo de alguns apontamentos, parece acidental, uma provocação à aparente turbulência da composição que assegura o compromisso com a nossa imaginação, que nos prende, que firma a nossa cumplicidade e nos pede para irmos mais fundo, mas de acidentes é composta esta expressividade, tanto quanto podemos afirmar que nela não há qualquer acidente ou contingência.
Cada peça é definitiva, cabe a nós entrarmos no jogo e deixarmo-nos perder. Aí então haverá tantos diálogos quanto olhares.

Entre obras que transportam algum figurativismo como Reflexos de Outono ou Ventos e Marés e outras do mais marcado expressionismo como a série Imagens do Tempo e Degraus da Imaginação, os sonhos e as metáforas plenos de simbolismo, revelam um caos fecundo numa provocação irresistível à ordem da abstração.
A pintura de Teresa Mendonça é bela, suavemente provocadora e de uma plasticidade extraordinária.
A exposição Ventos e Marés, presente no MAC envolve-nos num silêncio irrequieto e luminoso emanado da imensidão de mensagens que pacientemente aguardam a ordem da nossa atenção. E as obras que as emitem, merecem a nossa grata atenção.
Ajuda-nos a manter viva e disponível a todos esta biblioteca.

A & c – Quando começa um quadro, sabe como ele vai terminar?
T. M. – Não a minha pintura flui com o correr da minha vida.
Jornalista, Diretor. Licenciado em Estudos Artísticos. Escreve poesia e conto, pinta com quase tudo e divaga sobre as artes. É um diletante irrecuperável.